segunda-feira, 15 de junho de 2009

Coimbra | O que fiquei a saber...

Nas últimas horas fiquei a saber que quando aos teus interlocutores esmaece o tibre é porque alguma coisa falhou no enunciado e comprovas o carácter vaporoso do éter depois de lhe teres sentido o odor tão intenso. Fiquei a saber que só conheço felicidade em extremos e a sua antonímia em extremos a esses potênciados ou potenciáveis. Uma coisa é apenas tão boa como a certeza de que o resto do dia não alberga possíveis desilusões. Não foi o caso. É caso raro.

Hoje também soube que acabei por achar normal uma horda de coisas inimagináveis há escassos minutos atrás. Fiquei a saber que é possível suster o calor dos mais elementares orgãos internos durante o tempo de um telefonema e durante o tempo dos movimentos sôfregos da retina escandalizada e dolorosamente aberta frente a palavras mal bainhadas de um ecrã.

Depois, quando subi, embargou-me um sono contra o qual lutei. E agora escrevo. Isso não descubri hoje neste renovado acervo de dúvidas, mais importantes que as certezas, que aqui fica.

De todos os dias, são os límpidos que mais me reduzem: posso ver tudo a acontecer mas tem tudo aquela luz que as novelas têm quando aquilo é só uma cena do protagonista a sonhar ou, pior, a recordar. Artefactos cénicos aos quais já não consigo render o meu mais que intermitente abandono. Devolvo-o a quem se portou comigo da mesma maneira.

terça-feira, 12 de maio de 2009

Coimbra | He's too aware not to be...

Mesmo daqui, deste parapeito estreito e desconfortável onde amasso os ossos dos cotovelos para me empoleirar para te ver já só de costas seguir concluso preocupado com uma pequena parte do teu imenso dia, encontro o castanho acolhedor da terra molhada. Todas as suas derivações, aquele mais claro, onde a chuva ainda não chegou, que se solta com o vento e nos dá o famoso e inexistente "cheiro a chuva" até ao escuro, meio verde - a lama. Somos os três uma e a mesma coisa - eu, tu e o que não conhecemos ainda. Só queria não pensar em nada disto agora. Nem saber que me analisas e porque é que o fazes. Que alguém aqui ao meu lado, com a invejável leveza dos espíritos comuns, me pusesse a mão em conha na cara, por baixo dos caracóis desfeitos, desprezados, uma sombra.

Não demorei tempo nenhum nenhum a chegar a esta conclusão e no entanto é como se todos os dias ainda tivesse o problema para resolver. Consciência sem materialização. Conhecimento empacotado sem tratamento nem reportagem ao meu actual estado das coisas, à minha emergência sentimental mal dirigida.

Gostava de poder sempre dizer, em tudo, "Não tive nada a ver com isso". É a minha posição preferida para dormir. Nunca tenho muito a ver com as pessoas - não com as suas angustias, menos com os seus sucessos, menos com as coisas fortes que sentem. Nada disto me define.

A incompatibilidade é um sítio estranho. E quando ela é tudo menos o que existe consegue ser ainda mais estranho.

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Coimbra | Everything and then some ...

Persegui-te sunbeam pelas ruas onde te escondias do contraste da minha máquina. E queria ter-te a estoirar das janelas como só aqui. Não vieste. Esqueceste-me.

Era de noite e os paralelos das subidas, molhados, faziam as rodas do carro chiar num queixume sofrido de quem se vê em atalhos pouco conhecidos mas não quer acusar este desconforto. Aquele respirar superficial e fininho. Aquele não saber onde se meter.

Quis debruçar-me nos parapeitos de casas que não são a minha porque a minha não leva este estoiro de luz todas as manhãs. Esta claridade de dias de chuva.

Desprezei umas ruas, a breve euforia escorregadia da antecipação, e agora outras. Passos decididos a encontrar as praças-miradouros que são tantas. Suspensas em si. Sós.

Agora fica frio quando anoitece e eu ainda me queria lembrar de como era esperar-te.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Coimbra | Pouco importante ...

Ela queria um copo de água. Quem atendia no café estava há p'ra cima de um quarto de hora perdido no armazém e só se ouviam latas de cerveja a bater umas nas outras. Pensou em ir chamá-lo mas prendeu-a um cartaz do outro lado da rua. Teve que fechar um olho para ler. E pensou que é muito estranho ver-se melhor com um olho fechado do que com os dois abertos. E nesta situação nem era por querer. Quer dizer, o escolher ver parcialmente.

O rapaz que serve lá saiu lá de trás mas ela estava numa mesa atrás de um pilar que ficava no meio do bar que à noite funciona como discoteca e agora estava vazio. Ele não a viu e, de qualquer forma, era o cartaz do outro lado da rua, enrolado à volta de um poste de electricidade, que lhe prendia a atenção. Foi quando ela se levantou e espalmou as mãos no vidro do café para ler o cartaz. Sempre carros a passar. Muitas pessoas a parar ali. É uma paragem de autocarro. Engraçado como toda a gente traz um lenço de qualquer tipo.

É rádio que passa no café à tarde e não uma lista de músicas conhecidas como à noite. Pareceu-lhe ler "AULAS..." ( de quê?). Entretanto começou a ouvir rádio e o rapaz veio lavar o chão com uma esfregona ensopada. O som da água atirada ao chão. Ela esqueceu-se de pedir o copo de água. Serias aulas de ..." YOGA"?

"São esperados aguaceiros em todo o país."

E, quando a nuvem veio, ela encostou a cara ao vidro para ver aquele último raio de Sol que faz um risco no céu que as máquinas fotográficas modernas fazem desaparecer em prol da nitidez da paisagem. O Sol encadeia. É benevolente.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

Coimbra | I no longer ear the music ...oh no no no no no ...

Não preciso que me digas que pareço apagada e hostil. Que nada descurtinas nos tons cinzentos dos meus olhos, nas veias roxas das minhas mãos geladas. O despego e a solidão que já me são tão queridos ia agora abandoná-los por ti...

O que eu quero é que tu continues a fazer isso que eu não sei bem como fazes nem o que é. Distinguir neste emaranhado causticado aquelas características qe ninguém viu e que são as únicas que nunca me importei que transparecessem.

Não preciso que me digas que o tempo passa a correr nem que te esforces tanto para impor essa tua maneira de ser. Já a interiorizei. Já sei, está bem? Tudo isso já me atormentava muito antes de saberes que eu existia. As voltas que já te dei.

terça-feira, 7 de abril de 2009

Coimbra | Atrás de um portão ferrugento ...

... E agora que dissequei sem interrupções de terceiros as minhas memórias puídas, contraste no topo, objectiva sem zoom, é mais fácil começar a pensar em ti. O que faço eu contigo de mãos suadas perecíveis, que me bates aos pontos na falta de zelo por si próprio?

Rotina adinâmica do estilo one step flow of communication, vai secar um dia, infértil como os pântanos argilosos que criam enormes fendas no Verão e parecem arquipélagos. Podemos esbater as arestas com os dedos, unir mundos alucinados mas dá sempre menos trabalho apenas olhar os zigue-zagues assimétricos.

Para mim, há este tipo de liberdade recém-adquirida que é a de procurar situações nas quais não posso ter nenhum deslumbramento ou pretensão. Nada lhes posso acrescentar para as melhorar, anulando assim a responsabilidade. Afinal, é fácil ter uma consciência relativamente apaziguada se não se lhe der tanto uso. Uma vez iniciadas, é prostrar os braços ao longo do tronco em sinal de revolta, em homenagem em quem me ensinou esta frase, e sorver o deleite, sim, doentio, que é ser alguém sobre quem não recaem as mais míseras expectativas ...

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Coimbra | Quero linhas paralelas...

Quando chego de jantar vejo os teus talheres cruzados sobre o prato cheio. Pouco falta para estar ali a refeição toda. As folhas de alface já translúcidas da gordura do azeite e a primeira camada de arroz, seca. Do frango nada se pode reconhecer a olho nu mas há-de estar frio como morto.

O sono que me tolhe não facilita o enleio numa preocupação genuína. Quero acreditar no meu bom dormir e que não vou sonhar nem levantar-me durante a noite nem me vai custar nada adormecer nem vou revirar-me na cama, enrolar o lençol lá ao fundo aos pés de tantas voltas e espasmos entre os do estado insconsciente e os socos no ar por minha vívida iniciativa. Nem vou ficar com frio depois disso nem a irritação me vai incomodar. Pensar nisto ou pensar em ti. Se eu não te conhecesse dizia que tudo isto é vontade de chamar a atenção, um medo inefável dos dias que pensam ser os teus últimos comigo. Conhecendo-te, nada mais injurioso do que carente. O que não invalida a minha verdade. Como esse rancor endógeno que enquina a tua percepção das transformações que vão mesmo acontecer. Queres-me fazer acreditar que é um argmento inválido. Não o posso trazer para cima da mesa para desenhar à vista, o teu rancor. Era inválido, até. Até podia ser se tu não fosses tão patéticamente transparente.

Sendo tu hoje uma sombra do que eras, ai de mim se te disser alguma verdade. Sendo eu ainda um degradativo disso, sei reconhecer, como tu, as vantagens da redoma que preferes hoje a todo o Sol que ainda está para vir.